A receita do mestre
Autor(es): Camila Guimarães
Época - 23/05/2011
O governo vai lançar o primeiro concurso nacional para avaliar e selecionar quem dá aulas. Só falta decidir o que faz um bom professor
Quais são as características de um bom professor? Não existe uma receita definitiva. Mas especialistas defendem a ideia de que é possível identificar algumas habilidades básicas: dominar a disciplina que ensina, conhecer as etapas do desenvolvimento dos alunos e saber lidar com a turma. Porém, não é esse tipo de professor que encontramos na maioria das salas de aula brasileiras. Por isso, a baixa qualificação dos profissionais do ensino é apontada como um dos principais fatores para a má qualidade da educação do país. Agora, o Brasil pode ter uma chance de mudar. O primeiro concurso nacional para selecionar professores deverá ser aplicado a partir de 2012. A prova, elaborada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), ligado ao Ministério da Educação, avaliará os candidatos para a educação infantil e para o período de 1o a 5o ano do ensino fundamental. A ideia é que as redes municipais usem a prova voluntariamente.
A prova nacional é um avanço por dois motivos. Primeiro, deve melhorar os critérios de seleção. Hoje, a escolha é feita pelos municípios, os maiores contratantes de professores das séries iniciais. São mais de 5 mil redes municipais, cada uma com sua própria seleção. Em geral, elas padecem de baixo investimento financeiro e falta de pessoal técnico para garantir a boa qualidade das provas. O segundo efeito benéfico da prova nacional é menos evidente e talvez mais importante. O exame vai forçar o país a definir o que esperar de um bom professor. É algo que nunca esteve no papel de nenhuma das diretrizes educacionais promulgadas pelo governo. Em países com bons índices educacionais, como Chile, Canadá e Inglaterra, há parâmetros para a prática do ensino. Para chegar a uma lista de qualidades que todo professor deve ter, técnicos do Inep visitaram esses países e entrevistaram diretores de escolas brasileiras campeãs em aprendizado.
Também consultaram diversos especialistas em educação. E aí começaram os problemas. Os acadêmicos, ligados às faculdades de pedagogia não gostam da ideia de uma receita. “É difícil definir o que é um bom professor objetivamente, sem levar em consideração fatores externos, como as condições socioeconômicas dos alunos”, diz Dalila Andrade Oliveira, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. Ela questiona a necessidade de o professor conhecer a própria matéria que ensina. “O professor pode não dominar o conteúdo, mas saber ouvir e ser sensível aos alunos.” As associações acadêmicas marcaram um seminário, no final de maio, para analisar a proposta do MEC e dar sugestões de como a prova nacional poderia ser formulada. Quem precisa de bons professores agora diz que não pode se dar ao luxo de longos debates. “Essa prova é uma necessidade imediata”, diz Cleuza Repulho, presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação. Ela defende a ideia de uma referência objetiva para qualidade dos professores. “Para quem não sabe cozinhar, seguir uma receita garante que o resultado não será desastroso.”
A prova de seleção, sozinha, não vai salvar as escolas brasileiras. A carreira docente precisa ser mais atraente para que os jovens talentosos queiram dar aulas. No Brasil, segundo o Inep, a maioria dos que optam pela carreira docente está entre os alunos com piores notas no ensino médio. (grifo meu) Esses jovens poderiam ser atraídos por melhores salários e por um sistema mais justo de remuneração, que afasta os ruins e premia os melhores profissionais. Mas agora, pelo menos, já vai dar para saber o que cobrar em sala de aula.
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